28/07/2008

trecho de "TRATADO DESCRITIVO DO BRASIL" - 1587


"Tratado Descritivo do Brasil em 1587"

de GABRIEL SOARES DE SOUSA


C A P Í T U L O CLVI

Que trata da luxúria destes bárbaros.

São os tupinambás tão luxuriosos que não há pecado de luxúria que
não cometam; os quais sendo de muito pouca idade têm conta com
mulheres, e bem mulheres; porque as velhas, já desestimadas dos que
são homens, granjeiam estes meninos, fazendo-lhes mimos e regalos, e
ensinam-lhes a fazer o que eles não sabem, e não os deixam de dia, nem
de noite. É este gentio tão luxurioso que poucas vezes têm respeito às
irmãs e tias, e porque este pecado é contra seus costumes, dormem com
elas pelos matos, e alguns com suas próprias filhas; e não se contentam
com uma mulher, mas têm muitas, como já fica dito pelo que morrem
muitos de esfalfados. E em conversação não sabem falar senão nestas
sujidades, que cometem cada hora; os quais são tão amigos da carne que
se não contentam, para seguirem seus apetites, com o membro genital
como a natureza formou; mas há muitos que lhe costumam pôr o pêlo de
um bicho tão peçonhento, que lho faz logo inchar, com o que têm
grandes dores, mais de seis meses, que se lhe vão gastando espaço de
tempo; com o que se lhes faz o seu cano tão disforme de grosso, que os
não podem as mulheres esperar, nem sofrer; e não contentes estes
selvagens de andarem tão encarniçados neste pecado, naturalmente
cometido, são muito afeiçoados ao pecado nefando, entre os quais se não
têm por afronta; e o que se serve de macho, se tem por valente, e contam
esta bestialidade por proeza; e nas suas aldeias pelo sertão há alguns que
têm tenda pública a quantos os querem como mulheres públicas.

Como os pais e as mães vêem os filhos com meneios para conhecer
mulher, êles lhas buscam, e os ensinam como a saberão servir; as fêmeas
muito meninas esperam o macho, mormente as que vivem entre os
portugueses. Os machos destes tupinambás não são ciosos; e ainda que
achem outrem com as mulheres, não matam a ninguém por isso, e
quando muito espancam as mulheres pelo caso. E as que querem bem
aos maridos, pelos contentarem, buscam-lhes moças com que eles se
desenfadem, as quais lhes levam à rede onde dormem, onde lhes pedem
muito que se queiram deitar com os maridos, e as peitam para isso; coisa
que não faz nenhuma nação de gente, senão estes bárbaros.